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domingo, junho 25, 2006

Céfalo e Prócris

Este é o 4º Artigo da série Mitologia. Os três primeiros são:



Céfalo era um belo jovem, amante dos exercícios. Levantava-se antes do amanhecer, para perseguir a caça. Aurora o viu, apaixonou-se por ele e o raptou. Céfalo, porém, era recém-casado, e amava profundamente sua esposa que se chamava Prócris. A jovem era favorita de Diana, que lhe dera um cão, mais veloz que qualquer outro, e um dardo, que jamais errava o alvo; e Prócris oferecera estes presentes ao marido. Céfalo sentia-se tão feliz com a esposa, que resistiu a toda as propostas de Aurora, que , afinal, o despediu, irritada, dizendo:

-Vai, ingrato mortal, fica com tua esposa, a qual, se não me engano, hás de lamentar ter conhecido.

Céfalo regressou e voltou a ser tão feliz quanto antes, como sua esposa, e suas façanhas pelos bosques. Ora, aconteceu que uma divindade irritada mandara uma voraz raposa devastar a região, e os caçadores acorreram, em grande número, para capturá-la. Todos os seus esforços foram em vão; nenhum cão conseguia acompanhar o animal na corrida. E, finalmente, procuraram Céfalo, a fim de que lhes emprestasse seu famoso cão, cujo nome era Lelaps. Mal o cão fora solto, disparou como um dardo, com tal velocidade que a vista não podia segui-lo. Se não tivessem visto suas pegadas na areia, todos teriam acreditado que ele voara. De pé, no alto de um morro, Céfalo e os outros assistiram à corrida. A raposa tentou todas as artimanhas: corria em círculo, perseguida de perto pelo cão que, de boca aberta, investia sempre, mas mordia apenas o ar. Céfalo já ia lançar mão do dardo, quando viu o cão e a raposa pararem instantaneamente. Os deuses celestes, criadores de ambos, não queriam que nenhum dos dois saísse vitorioso. E, em sua própria atitude de vida e de ação, haviam sido petrificados. Tão naturais pareciam, que, ao vê-los, tinha-se a impressão de que um ia latir e a outra dar um salto para a frente.

Céfalo, embora tivesse perdido o cão, continuou a deleitar-se com a caça. Saía pela madrugada, vagava pelos bosques e pelos montes, sem qualquer acompanhante, não necessitando ajuda, pois seu dardo era arma segura para todos os casos. Fatigado com a caça, quando o sol ia alto no céu, procurava um abrigo sombreado, junto ao qual corria um frígido regato e, estendido na relva, com as vestes atiradas para um lado, gozava a frescura da brisa. Às vezes, costumava dizer em voz alta:

- Vem, brisa suave, vem afagar-me e leva o calor que me abrasa.

Alguém que passava um dia, ouviu-o falando desse modo ao ar e, acreditando, por tolice, que ele estivesse falando com alguma mulher, correu a contar o segredo a Prócris, sua esposa. O amor é crédulo. Prócris, diante do choque, desmaiou. Voltando a si, sem demora, disse:
- Não pode ser verdade; não acreditarei nisso, a não ser que eu mesma seja testemunha.

Assim, aguardou, com o coração ansioso, até a manhã seguinte, quando Céfalo saiu, como de costume. Acompanhou-o, então, furtivamente, e escondeu-se no lugar que o informante indicara. Céfalo apareceu, quando se sentiu cansado da caçada, e estendeu-se na verde relva, exclamando:

- Vem, brisa suave, vem afagar-me. Sabes quanto te amo! Tu tornas deliciosos os bosques e minhas caminhadas solitárias!

Continuava a soltar estas exclamações, quando ouviu, ou julgou ouvir, no meio do bosque, um ruído semelhante a um soluço. Supondo ser algum animal selvagem, atirou o dardo na direção do ruído. Um grito de sua amada Prócris revelou-lhe que a arma atingira o alvo com precisão. Correu para o lugar e encontrou-a ensangüentada, tentando arrancar da ferida o dardo, que fora presente dela mesma. Céfalo ergueu-a do chão, lutou para estancar o sangue, gritou-lhe que viesse, que não o deixasse desamparado, recriminando-se de sua morte. Ela entreabriu os olhos e conseguiu murmurar estas palavras:

- Imploro-te, se algum dia me amaste, se algum dia mereci de ti benevolência, meu marido, que satisfaças minha última vontade: não te cases com essa odiosa Brisa!

Isto revelou todo o mistério; mas que adiantava revela-lo agora? Prócris morreu, mas seu rosto tinha uma expressão de calma, olhando com ternura e perdão para o marido, que a fez compreender a verdade.

Thomas Moore, ente suas “Baladas Legendárias”, tem uma sobre Céfalo e Prócris, que assim começa:

Num campo, um caçador repousou, certo dia,
Para do sol se abrigar
E, deitado, implorava à brisa que fugia
O rosto lhe beijar.
E, enquanto assim pedia, a brisa descuidada
Fugia para além.
Chamava o caçador: “Ó vem brisa adorada!”
“Brisa adorada, vem!”.

Não deixe de ler o próximo artigo JUNO E SUA RIVAIS a ser postado em breve.